Vítor Manuel Tavares Ribeiro 1941 – 2018
Nasceu em 07-02-1941, em Lisboa.
Em 1956 frequentou o COM em Mafra e o Curso de “Comandos” em Angola. Pertenceu à 2.ª Companhia de Comandos, do então Capitão “Cmd” Jaime Neves, que actuou em Angola e Moçambique em 1965/1967, sendo promovido por distinção a Tenente miliciano e galardoado com a da Cruz de Guerra de 2.ª classe e a Medalha de prata de Valor Militar.
Na véspera do seu falecimento, ocorrido em 24 -03-2018, depois de doença prolongada, foi condecorado com a Ordem do Infante D. Henrique (Comendador), por sua Exª, o Presidente da República.
A vela será feita na Basílica da Estrela, a partir das 18H00 de amanhã e o funeral decorrerá desde as 13H30 de 26-03-2018.
Foi fundador e Presidente da Associação de Comandos desde 1975. Exerceu estas funções até 1992 e ainda, entre 1998 e 2004.
Transcreve-se do seu depoimento feito para o livro «25 de Novembro de 1975; Os “Comandos” e o Combate pela Liberdade»/2005, de Manuel A. Bernardo, F. Proença Garcia e R. Domingues da Fonseca:
“(…) A primeira preocupação desse grupo era aquilo que se prenunciava, então, vir a ser a descolonização. Encontraram aí outros elementos não “Comandos” e iniciaram contactos e reuniões, que se foram alargando com alguma dificuldade.
“Um grupo deles (os então Majores José Pais e Caçorino Dias, o Marques Aparício) chegou a ir a Angola, em 1974, com o patrocínio do então Presidente da República, General António de Spínola e, durante as reuniões em Luanda e noutros locais, foram-se apercebendo de que a maioria dos combatentes presentes nesses encontros eram elementos oriundos dos “Comandos”.
“Assim sendo, no regresso a Portugal – porque a situação continuava a deteriorar-se e ainda por, nessa altura, começarem as primeiras perseguições aos “Comandos” em Angola, Moçambique e, depois, na Guiné, onde foram fuzilados muitos elementos (cerca de quatro dezenas) do Batalhão de Comandos da Guiné resolvemos organizarmo-nos para podermos enfrentar a situação.
“Começámos a procurar contactos. Dirigimo-nos ao Batalhão de Comandos, comandado pelo então Major Jaime Neves, a quem pessoalmente me unia uma grande amizade e camaradagem e, através dele, conseguimos contactos com muitos “Comandos”, que se encontravam na disponibilidade espalhados pelo País.
“A decisão de formar a Associação de Comandos tinha em vista em termos uma face legal e visível, e podermos avançar com contactos para uma eventualidade de uma organização, que não fosse tão visível , uma organização clandestina. (…)
“No dia 31 de Julho de 1975, o então Coronel Jaime Neves tinha sido impedido de entrar na unidade, assim como outros oficiais da sua confiança, incluindo o 2.º Comandante, Major Lobato Faria, foram detidos numa sublevação armada.
“Nessa altura, o Coronel Jaime Neves chamou alguns dos membros numa da comissão organizadora da Associação e perguntou-nos quantos “Comandos”, na disponibilidade poderíamos arranjar, caso fosse necessário fazer um assalto à unidade.
Afirmarmos ter quinhentos homens prontos. Resolveu, então, ir falar com o General Otelo, que chegara de Cuba, comunicando-lhe o sucedido e ameaçando que, se não fosse resolvida a situação e reposto o comando do Regimento, procuraria tomá-la de assalto com aquele efectivo disponível.
“No dia 4 de Agosto, o General Otelo promoveu uma Assembleia na unidade. Nela já estiveram presentes todos os oficiais que tinham saído no fim de semana, e o Coronel Jaime Neves foi reposto no comando do Regimento.
“Ele reconheceu, então, a necessidade urgente de tomar uma decisão sobre a proposta que lhe vínhamos fazendo, havia algum tempo: a entrada, para o Regimento, de “Comandos” na disponibilidade e que lhe podiam garantir confiança.
“Todavia, só com o VI Governo Provisório, após o sequestro do Primeiro-Ministro, Almirante Pinheiro de Azevedo, em São Bento, e que for a libertado em 22-9-1975, pela C.Cmds 113, do Capitão Manuel Apolinário, foi elaborada a legislação adequada. (…)
“Quando foi publicado (n.º 577-A/75 de 8-10-1975), os elementos da comissão organizadora da Associação de Comandos iniciaram reuniões no Estado-Maior do Exército, para preparar as condições de admissão dos referidos “Comandos”. Recordo que os nossos interlocutores, no EME, foram os Tenente-Coronéis Sacramento Marques e Tomé Pinto. (…)
“SaIienta-se que o referido Decreto-Lei saiu para todas as forças especiais, mas apenas os “Comandos” se apresentaram como voluntários.
“A Associação de Comandos organizou quatro equipas de recrutamento. Uma ficou sediada em Lisboa e as outras foram para o Centro do País, Trás-os Montes e Minho. Em cerca de dez dias, com base nas listagens das histórias de companhia, foram batendo porta a porta, contactando as pessoas, muitas vezes em sua casa, outras vezes nos campos ou nos seus empregos, e convidando-os a vir para o Regimento de Comandos. (…)
“Em meados de Outubro, os elementos contactados apresentaram-se no Regimento de Comandos, que fez a sua triagem para a formação das companhias. Os oficiais foram indicados pela Associação de Comandos, por se pretender que alguns dos elementos recrutados ficassem fora da unidade, para continuar o trabalho da Associação. Foram propostos para comandar a C.Cmds 121, o José Sousa Gonçalves, e para C.Cmds 122, o Jorge Sampaio de Faria, que foram graduados em capitão.
“O Regimento de Comandos ficou, assim, com quatro companhias, incluindo as C.Cmds 112 e 113, existentes do antecedente, com elementos já formados em Portugal. Recorde-se que, em termos comparativos, os fuzileiros tinham, na altura doze companhias. (…)
“Entretanto a Associação de Comandos tinha sido oficializada, em escritura notarial, em 14 de Novembro de 1975. (…)
“No dia 20 desse mês, o Coronel Jaime Neves, acompanhado do Major Lobato Faria e dos capitéis Arnaldo Cruz, Afonso Lourenço e Sousa Gonçalves deslocaram-se ao AMI, onde, reunião com o Brigadeiro Melo Egídio, deram 48 horas para que fosse reposta a ordem no país, declarando-se prontos a atuar. Creio que estava presente então Major Ramalho e Eanes e aí ficou decidido elaborar um documento escrito sob tal posição.
“Entretanto, o Coronel Jaime Neves tinhamos posto a hipótese de determinadas unidades, nomeadamente o Regimento de Comandos, o CIAAC, a EPI e a EPC se retirarem para zona do paralelo de Rio Maior, faça o possível formação da Comuna de Lisboa. (…)
“Em 23 de Novembro, a seguir ao jantar, o Coronel Jaime Neves informou o Regimento de que estava a chegar material de guerra oriundo de Angola, com os pára-quedistas comandados pelo Tenente-Coronel Heitor Almendra, e que a PM pretendia impedir que esse material fosse levado para o Norte do País.
“A C.Cmds 121, comandada pelo Capitão Sousa Gonçalves, saiu imediatamente para a Ajuda, com dois grupos de comandos – quarenta homens e quatro chaimites – para impedir a saída da Polícia Militar. (…)
Actuando no contra-golpe do 25 de Novembro
“Na madrugada do dia 25, os pára-quedistas ocuparam o GDACI, e as Bases de Montijo, Monte Real. Ota e Tancos. (…)
“No dia 26, às cinco da manhã, os “Comandos” foram rendidos em Monsanto por uma companhia da EPI e regressaram à Amadora. Durante essa noite, elementos da Associação de Comandos, nos seus carros e à civil, deslocaram-se a várias unidades de Lisboa: RALIS, EPAM e RPM e também à sede do PCP, alertando pelo telefone o que iam observando. Na Calçada da Ajuda verificámos um levantamento de barricadas, a presença de civis armados e de Carlos Antunes do PRP/BR.
“Na madrugada desse dia 26, o Coronel Jaime Neves pediu a nossa comparência no Regimento de Comandos. De imediato, apresentaram-se bastantes “Comandos” na disponibilidade, incluindo elementos da Associação, a quem o Comandante solicitou para se fardarem, a fim de acompanhar as C.Cmds 112 e 113, que iriam deslocar-se para a Ajuda.
“Ele tinha mandado descansar as C.Cmds 121 e 122, pois pretendia utiIizá-las em Tancos, no previsível confronto com os pára- quedistas.
“A actuação ocorreu como se encontra escrito no Relatório das Operações.
“Apenas quero salientar a ação de vários elementos da Associação, que atuaram sobre a Direcção da Arma de Cavalaria, em conjunto com equipas de comandos e oficiais do Regimento de Comandos e, depois, a partir daqui, sobre a parada do RPM.
“Eu acompanhava o Coronel Jaime Neves, na chaimite que foi utilizada para rebentar com o portão de entrada daquela unidade. Tal apenas foi conseguido segunda tentativa, face a algum receio do condutor.
“A parada foi invadida, havendo ainda uma troca tiros muito rápida, pois, Na mesma altura, surgiu o Major Mário Tomé, que nós conhecíamos muito bem de Moçambique. Apareceu de braços levantados pedindo o cessar fogo, que praticamente foi imediato, devido à grande disciplina de fogo, que é o apanágio dos “comandos”. Aquele oficial fez uma apresentação militar impecável ao Coronel Jaime Neves, que mandou formar todo pessoal da PM na parada. (…)
“Às 14H30, as companhias de comandos seriam rendidas por pessoal do RIQ, regressando à Amadora. Depois, iniciaram-se os preparativos para a actuação em Tancos, o que felizmente não foi necessária, devido às diligências realizadas para a rendição, na altura levadas a efeito pelo Tenente-Coronel Pára-quedista Heitor Almendra.
“Ainda na noite do dia 26, dois carros pertencentes a elementos da Associação de Comandos e conduzidos por eles à civil, embora armados, transportaram o Major de Tms, Costa Dias, ao Porto Alto, para remover os cristais e os osciladores das antenas, para silenciara emissão do Rádio Clube Português.
Concluindo…
– Os nomes do Tenente José Coimbra e do Furriel Joaquim Pires mortos na Calçada da Ajuda, foram esquecidos e apenas actualmente são lembrados pela Associação de Comandos.
“- Os “convocados” foram antecipadamente devolvidos à vida civil, e muitos ficaram sem os seus empregos. A Associação de Comandos teve que lhes dar o apoio possível, depois de já ter apoiado “Comandos” retornados de Angola e Moçambique. Mais tarde, a Associação viria igualmente a apoiar os “Comandos” do Batalhão da Guiné, que conseguiram fugir para o Senegal, onde os fomos buscar. Receberam alimentação, alojamento e, posteriormente, emprego.
“- Os poucos “convocados” que puderam manter-se no serviço activo, mormente oficiais e alguns sargentos, pertencem hoje ao quadro técnico e secretariado. Não receberam louvores nem condecorações. O Coronel Jaime Neves passou à reserva. O Regimento de Comandos, depositário das tradições e experiências únicas, de um espírito de corpo que permitiu actuar decididamente em situações de evidente inferioridade, chegou a ser extinto.
“- Assim foram recompensados os “Comandos”!
Em Novembro de 2005″
Assim se lutou pela Liberdade e pela Democracia em Portugal. E foi deste modo que Vítor Ribeiro se destacou como grande combatente em África e nomeadamente no restabelecimento da ordem e da vida democrática, em 25/26 de Novembro de 1975.
Apresento as minhas sentidas condolências à família enlutada e descansa em Paz!
Cor. Manuel Bernardo
24-03-2018